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Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis

GABINETE DA PRESIDÊNCIA DO IBAMA

 

Ofício nº 853/2019/GABIN

Brasília, 14 de outubro de 2019.

A Sua Excelência o Senhor

ANDRÉ LUIZ DE ALMEIDA MENDONÇA

Advogado-Geral da União

Ed. Sede I - Setor de Autarquias Sul - Quadra 3 -Lote 5/6 - ed. Multi Brasil Corporate

CEP: 70610-460 -  Brasilia/DF

 

Assunto: Estudo realizado pela Câmara Técnica de Restauração Florestal e Produção de Água (CTFlor).

Referência: Caso responda este Ofício, indicar expressamente o Processo nº 02001.004154/2016-61

 

Prezado Senhor Advogado-Geral da União,

Ao cumprimentá-lo, reporto-me ao estudo realizado pela Câmara Técnica de Restauração Florestal e Produção de Água (CTFlor), integrante do Comitê Interfederativo (CIF), responsável por tratar da recuperação ambiental do desastre de Mariana.

A CTFlor, a partir de procedimentos operacionais e recomendações, elaborou a Nota Técnica 09/2019/CT-FLOR/GABIN (SEI 6156084) em 09/10/2019, sobre os entraves encontrados na execução dos programas de restauração florestal em larga escala na Bacia do Rio Doce, que estão sob sua competência. Tais programas estão previstos no Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC)/Termo de Ajustamento de Conduta relativo à Governança (TAC-Gov), que têm o acompanhamento pelo CIF e cuja Presidência e Secretaria Executiva são exercidas pelo Ibama.

Ocorre que foram detectados entraves para a execução dos programas de restauração florestal em larga escala, que atendessem aos objetivos do referido TTAC/TAC-Gov e que fossem passíveis de implementação e de adesão pelos produtores rurais da Bacia do Rio Doce, após os desdobramentos do acidente lá ocorrido, envolvendo questões relevantes como o uso adequado do solo, com vistas à recuperação ambiental e econômica das propriedades.

Entende a Câmara Técnica que somente a recuperação das nascentes e de APP’s não alcançará por si só o objetivo maior do TTAC/TAC-Gov ,que é o incremento da produção de água, necessitando, outrossim, da adoção de medidas de uso sustentável da terra através de práticas agrícolas que garantam a produtividade dos imóveis, diminuindo a pressão às áreas que são de preservação permanente por força da lei. Esse uso sustentável viria pela aplicação do CFlo (arts. 61-A e 61-B), o que estaria obstado pelo entendimento de que no bioma Mata Atlântica somente se aplica a Lei 11.428/2006, mesmo que esta seja expressa, em seu artigo 1º, em aplicar “a legislação ambiental vigente, em especial a Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965” (Código Florestal então vigente), na proteção e a utilização do Bioma Mata Atlântica.  Ainda que se fizesse leitura meramente literal do artigo 1º da Lei do Bioma Mata Atlântica, o que se admite apenas para argumentar, não se atualizando a previsão do CFlo de 1965 (Lei 4.771) para o de 2012 (Lei 12.651), indubitavelmente este seria aplicável por se compreender no conceito de “legislação ambiental vigente”.

A referida Nota técnica ainda se reporta às manifestações dos Estados do Espírito Santo e de Minas Gerais, os quais, por meio dos seus órgãos jurídico e ambiental se manifestaram favoravelmente à aplicação dos artigos 61-A e 61-B do CFlo vigente, dentro da Bacia do Rio Doce, em razão de que “a metragem das APP´s hídricas a serem recuperadas, conforme a legislação a ser adotada, poderá ocasionar a necessidade de redução das áreas utilizadas pelos proprietários rurais nas atividades em sua propriedade, incluídas as agrossilvipastoris, o que poderá inviabilizar economicamente alguns imóveis rurais e comprometer a autonomia familiar”, considerando-se, ainda queo relevo bastante acidentado de parte significativa da paisagem mineira, por si só, gera maior quantitativo de áreas passíveis de proteção e consequente restrição de uso pelo produtor rural”.

Sabe-se da importância da definição da faixa de APP a ser recuperada, principalmente como no caso concreto em que mais de 80% das propriedades da bacia possuem tamanho inferior a quatro módulos fiscais, categoria com previsões específicas na Lei 12.651/12 (Código Florestal), a qual autoriza a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008.  

A intervenção nas APPs, dado o seu valor estratégico na manutenção da biodiversidade, deve considerar a possibilidade de compatibilização de atividades de baixo impacto ambiental – como podem ser consideradas das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural – com a sua função ambiental. Exemplo disso, é a utilização de Sistemas Agroflorestais – SAF’s como modalidade de recuperação de APP´s. Cabe pontuar que os SAF’s constituem ambientes biodiversos capazes de consorciar a geração de renda, recuperação ambiental e melhora na qualidade de vida no imóvel rural e que seu uso como modalidade de recuperação de áreas degradadas vem crescendo no Brasil e no mundo. Este crescimento pode ser justificado pela quantidade expressiva de serviços ambientais e ganhos econômicos gerados por estes ecossistemas. Destaca-se que o inciso VI do artigo 3º do Decreto 8.972/17 estabeleceu o SAF como uma das modalidades de recuperação da vegetação nativa e que a Lei 12.651/12 o prevê como uma das formas de recuperação de APP’s, nos termos do inciso IV do § 13 do artigo 61-A.

A possibilidade de utilização de SAF’s, como forma de propiciar aos produtores rurais da bacia a recuperação ambiental das áreas degradadas de APP com algum retorno econômico, mesmo que temporário, foi amplamente discutida pelos técnicos no âmbito dos escopos dos programas da CTFlor, mas encontrou óbice na divergência jurídica existente quanto à aplicação dos artigos 61-A e 61-B da Lei 12.651/12.

Assim, diante da imperiosa necessidade de se efetivar a restauração das condições de vida das pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão, conforme cláusula segunda, IV, do TAC-Gov, com a execução efetiva dos programas de recuperação socioambiental do desastre de Mariana, objetivo ao qual cabe o CIF zelar pela concretização, de forma a promover o desenvolvimento sustentável daquela região já tão atingida pelos desastres de Mariana e Brumadinho, solicita-se a revisão do entendimento da inaplicabilidade do Código Florestal no Bioma Mata Atlântica.

   

  

Atenciosamente,

 

EDUARDO FORTUNATO BIM

Presidente do Ibama


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Documento assinado eletronicamente por EDUARDO FORTUNATO BIM, Presidente, em 14/10/2019, às 09:31, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 6º, § 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.


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Referência: Processo nº 02001.004154/2016-61 SEI nº 6180504

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